quarta-feira, 28 de março de 2012

Proposta de herdar táxi é derrubada

Chico Marés
 
A bancada de apoio ao prefeito na Câmara de Curitiba apresentou uma nova emenda à lei que regulamenta os serviços de táxi, votada em segundo turno ontem. Pela proposta, a transferência da autorização para se ter um táxi e a herança dessa permissão seriam autorizadas. A emenda, que para juristas é inconstitucional, foi proposta já no segundo turno da votação da lei. Entretanto, causou polêmica entre os vereadores e acabou sendo retirada de pauta após acordo entre as bancadas. A lei foi aprovada sem a inclusão desses dispositivos.
A apresentação da emenda foi polêmica. Normalmente, elas são apresentadas e votadas ainda no primeiro turno, e são apenas referendadas no segundo. Nesse caso, a proposta foi apresentada por vereadores da bancada de apoio depois de toda a discussão do projeto, no qual houve a votação de outras seis emendas – cinco delas rejeitadas e uma aprovada. Para o líder da bancada, Roberto Hinça (PSD), trata-se de um mecanismo normal do processo legislativo, já que o segundo turno existe para que haja nova chance de uma ideia ser inclusa.
Debate
Emenda “legalizaria” clandestinidade
A emenda apresentada pela bancada de apoio ao prefeito para legalizar a transferência de placas, além de inconstitucional, serviria para “legalizar” o mercado clandestino de placas de táxi na cidade de Curitiba. Em 2008, a Gazeta do Povo e a RPC TV mostraram como funciona esse esquema. Na época, as licenças, que deveriam ser um bem público, eram vendidas a R$ 180 mil e viravam um negócio lucrativo na mão de pessoas que, muitas vezes, jamais sequer dirigiram um táxi. O número insuficiente de placas disponíveis na capital teria inflacionado este mercado, já que nos anos 90 ela custava cerca de R$ 25 mil.
Para o professor de Direito Constitucional da UFPR Egon Bockmann, essa emenda seria ruim para os taxistas, já que a compra de uma placa exigiria um aporte econômico incompatível com seus rendimentos. “Iria ter um táxi somente quem tivesse poder econômico”, afirma. Além disso, ela favoreceria a concentração do setor, que ficaria restrito a poucos proprietários que operam o sistema. Isso teria uma influência negativa no valor da tarifa, que poderi’a ficar ainda mais cara para o usuário. (CM)
O teor da proposta desagradou aos vereadores da oposição e até mesmo alguns membros da bancada de apoio. A vereadora Professora Josete (PT) chegou a qualificar, em plenário, a Câ­­mara como um “balcão de negócios”, e considerou o projeto in­­constitucional. “Nós estamos falando de uma concessão pública, é um serviço que o município não pode prestar e que autoriza que uma pessoa ou empresa faça. Eu entendo que essa emenda transforma uma concessão pública em um direito privado”, afirma. A vereadora considera também que o projeto legitima e incentiva o mercado clandestino de placas e prejudica os motoristas de táxis.
Hinça contesta a interpretação da vereadora. Para ele, esse projeto visava garantir direitos às viúvas e filhos de taxistas, e está dentro da legalidade. “É importante a gente deixar bem claro para a sociedade que, lá em Brasília, já passou pela Comissão de Comissão e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados um projeto semelhante ao nosso. Já houve o parecer legal para o pedido de transferência”, afirma. De acordo com o vereador, a proposta foi retirada para que a redação fosse aprimorada e será apresentada novamente em um momento oportuno.
Inconstitucional
Para juristas, a proposta beira o absurdo. Segundo Rodrigo Pi­­ronti, professor de Direito Admi­­nistrativo e Empresarial da Uni­­versidade Tuiuti do Paraná (UTP), é completamente ilegal passar a licença de táxi de pai para filho. “Este tipo de licença é o que chamamos no Direito de ato administrativo personalíssimo, ou seja, se extingue assim que a pessoa morre, não podendo ser herdada por terceiros. Para que o filho do motorista adquira o direito de conduzir um táxi é necessário que ele tenha a concessão de uma nova licença, que seja aberto um novo ato administrativo.”
Já o professor de Direito Cons­­titucional da Universidade Fe­­deral do Paraná (UFPR) Egon Bock­­mann considera que uma autorização do estado para exercer um serviço público não pode ser transformada em propriedade, e não pode ser repassada a quem quer que seja – gratuitamente ou mediante pagamento. “A licença, a rigor, permite que um determinado sujeito preste um serviço público. Esse serviço continua sendo público. Logo, não pode ser objeto de herança”, afirma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário