Segundo o MP, socorristas e médicos não estão preparados para lidar com emergências que envolvam pacientes psiquiátricos Saúde
Diego Antonelli
Ministério Público recomenda que os serviços
de emergência médica de Curitiba fiquem responsáveis pelo internamento
forçado de usuários de drogas
O Ministério Público (MP) Estadual fez uma cobrança formal para que a rede de atendimento de emergência de Curitiba cumpra o seu papel e encaminhe pacientes com problemas psiquiátricos e usuários de drogas e álcool em estado grave para internamento involuntário (sem o consentimento do paciente). A recomendação administrativa, expedida pela promotora Fernanda Garcez, diz que o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e os Centros Municipais de Urgências Médicas (CMUMs) devem ser os responsáveis por acolher e avaliar se o paciente necessita ser internado. Dessa forma, caberia tanto ao Samu quanto ao CMUM procurar leitos e encaminhar os casos urgentes para tratamento hospitalar.
Capital tem menos leitos do que a OMS recomenda
A quantidade de leitos psiquiátricos em Curitiba caiu 12% entre março de 2012 e março deste ano, segundo o Ministério da Saúde. Os 668 leitos hoje existentes – sendo 379 destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS) – não são capazes de atender a recomendação mínima da Organização Mundial de Saúde (OMS).De acordo com a OMS, para uma assistência psiquiátrica adequada é necessário um leito psiquiátrico para cada mil habitantes. Hoje, a capital do Paraná tem 0,38 leito por mil moradores.
O mesmo acontece com a estrutura para internação psiquiátrica no estado. O Paraná viu o número de leitos cair de 3.248 para 3.084 em um ano, ficando com 0,29 leito por habitante.
“Não existem leitos psiquiátricos suficientes em Curitiba. O Ministério da Saúde aplica menos de 3% do orçamento em saúde mental. No Canadá são 11%”, afirma o presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, André Rotta.
Fechamento
Segundo ele, a Lei n.º 10.216/2001, que trata do assunto, fechou um grande número de leitos psiquiátricos nas últimas décadas.
“Desta forma, muitos pacientes que necessitavam de internamentos ficaram desassistidos. Sabe-se, através dos trabalhos científicos, que existem pacientes que necessitam de internamento seja para recuperar-se de um surto psicótico, seja para evitar uma crise de abstinência causada pela dependência química, seja para protegê-lo de uma tentativa de suicídio”, diz.
Glossário
Saiba como diferenciar os tipos de internação médica:Internação voluntária: Quando o paciente aceita ser internado e tem o apoio da família.
Internação involuntária: É quando o familiar ou um terceiro solicita a internação, desde que o pedido seja feito por escrito e aceito pelo médico. A lei determina que, nesses casos, os responsáveis técnicos do estabelecimento de saúde têm prazo de 72 horas para informar ao Ministério Público da comarca sobre a internação e seus motivos. O objetivo é evitar a possibilidade de esse tipo de internação ser utilizado para a prática de cárcere privado.
Internação compulsória: Neste caso, não é necessária a autorização familiar. O artigo 9.º da Lei nº 10.216/2001 estabelece a possibilidade da internação compulsória, sendo esta sempre determinada pelo juiz competente, depois de pedido formal, feito por um médico, atestando que a pessoa não tem domínio sobre a sua condição psicológica e física.
“Há a ideia de que a pessoa não pode ser internada sem sua vontade. Mas ela pode”, ressalta Fernanda. A legislação permite que as internações involuntárias ocorram desde que um terceiro solicite e um médico ateste a necessidade. “A nossa cobrança é para que as pessoas em estado grave e em surto psicótico tenham tratamento adequado o mais rápido possível”, explica.
A promotora salienta que a medida não significa que todo atendimento psiquiátrico deva resultar em internação. “Mas os médicos do Samu e do CMUM devem saber filtrar a gravidade da situação e, nos casos de urgência psiquiátrica, solicitar a internação. Isso deveria acontecer em todo o estado.”
Despreparo
O presidente da Sociedade Paranaense de Psiquiatria, André Rotta, confirma a falta de preparo dos médicos e socorristas que atendem casos de urgência. “Infelizmente, por não haver serviços de emergência psiquiátrica em Curitiba e profissionais treinados nos serviços de emergência clínica, não temos psiquiatras atendendo em hospitais. Acredito que os serviços de emergência e urgência do nosso município hoje não estejam aptos a atendê-los”, afirma.
O diretor estadual de Políticas de Urgência e Emergência e coordenador do Samu, Vinícius Filipak, afirma que todo ano os profissionais passam por capacitações para atender qualquer caso de urgência. “Conforme a gravidade do paciente com transtorno mental é possível que ele seja encaminhado direto para o hospital de acordo com as vagas de leitos disponíveis”, salienta.
Prefeitura afirma que já faz encaminhamento
A Secretaria de Saúde de Curitiba, por meio da assessoria de imprensa, informou que psiquiatras fazem consultas diárias nas oito unidades do Centro Municipal de Urgências Médicas (CMUM). O objetivo, segundo o órgão municipal, é dar o encaminhamento adequado aos pacientes que dão entrada nessas unidades. “Dependendo de cada caso e conforme a avaliação psiquiátrica, os pacientes podem ser encaminhados para hospitais psiquiátricos de Curitiba e região para atendimento nos Centros de Atendimento Psicossocial (Caps) ou mesmo acompanhamento médico nas unidades básicas de saúde”, informa a secretaria.
Em maio, foi inaugurado pela prefeitura de Curitiba o Caps 24 horas do Boqueirão, com 13 vagas para acolher pacientes portadores de transtornos mentais durante a noite e capacidade de atender até 400 pessoas por mês.
Para atender os usuários de álcool e drogas, foi ampliado o horário de atendimento dos Caps Cajuru e Portão, que agora funcionam em tempo integral, inclusive nos finais de semana, num total de 21 vagas noturnas. Para crianças e adolescentes com dependência química, a rede de saúde mental oferece o serviço 24 horas do Caps Centro Vida, na Vila Izabel, com cinco vagas noturnas.
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