quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Por que o PT comemora a Constituição que não aprovou?

Pedro Luiz Rodrigues


Entre as inúmeras coisas boas que o Brasil oferece a seus políticos está a curta, curtíssima, memória de nossa sociedade.
Assim, sem o risco de produzir qualquer dano à imagem, o político pode dizer hoje e desdizer amanhã, mentir e desmentir, mudar de posições como se muda de camisa. Tudo fica na mesma.
Fiquei pensando nisso ontem, no Senado, quando assistia à cerimônia de comemoração dos 25 anos da Consitutição de 1988.
Quantos sorrisos, quantos aplausos  na plateia. quando se anunciava os nomes dos agraciados pela Medalha Ulysses Guimarães. Entre os quais, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O mesmo Lula que, em 22 de setembro de 1988, então deputado constituinte, em emocionante discurso, explicou as razões pelas quais comandara seu partido a votar contra a nova Constituição, a mesma que nos vale e protege até hoje, a mesma que foi comemorada ontem.
O PT votou contra, explicou então Lula, mas “assinará a Constituição, porque entende que é o cumprimento formal de sua participação nesta Constituinte!”
A Constituição que então se aprovava não servia ao PT, anunciava o nobre parlamentar há 25 anos, pois a composição da Constituintenão era “favorável aos projetos políticos da classe trabalhadora”.
Por que aprovar aquele projeto se a maioria desprezara aquele outro, que o Partido havia apresentado em março de 1987?
Lula rejeitava a nova Carta Magna, depois de duas décadas de regime de exceção, porque seu partido achava que o projeto não havia dado à classe trabalhadora tudo o que ela esperava: “Entramos aqui querendo 40 horas semanais, e ficamos com 44; entramos querendo férias em dobro, e ficamos apenas com um terço a mais; entramos querendo a hora extra em dobro, e ficamos com apenas 50%”.
E a questão do capital, então? Ficara intacta. “Patrão, neste País, vai continuar ganhando tanto dinheiro quanto ganhava antes, e vai continuar distribuindo tão pouco quanto distribui hoje. É por isto que o Partido dos Trabalhadores vota contra o texto e, amanhã, por decisão do nosso diretório – decisão majoritária – o Partido dos Trabalhadores assinará a Constituição, porque entende que é o cumprimento formal da sua participação nesta Constituinte!”
Ao abrir a sessão especial de ontem, o senador Renan Calheiros — ele também constituinte e um dos homenageados —, enumerou as ­inovações do documento aprovado em 1988, como o atendimento especial às pessoas com deficiência, a demarcação de terras indígenas, o reconhecimento dos direitos dos quilombolas, a previsão de referendos e plebiscitos, a garantia do salário mínimo e o fortalecimento do Ministério Público.
Foram 78 direitos individuais e coletivos, além dos 58 dispositivos dos direitos sociais. Muitas dessas conquistas tornaram-se realidade com o trabalho dos congressistas — observou o presidente do Senado.
Mas depois da festa em que não podia se sentir muito confortável, por não se incluir entre os que aprovaram a Constituição, Lula foi para outra, na Câmara, onde aí pontificou sozinho. Aí, em vez de uma medalha, recebeu duas: uma a da Suprema Distinção, por sua trajetória política; outra, a da Constituinte, por sua participação na elaboração da Carta de 1988.
Lula aproveitou a celebração para cobrar dos parlamentares a aprovação de uma reforma política capaz de incutir vitalidade do Congresso. “Precisamos requalificar os partidos, reduzir a força do poder econômico nas eleições e ampliar as formas de participação da sociedade no processo legislativo”, disse. “A reforma política enfrenta resistências, mas não vejo outra maneira de se exercer a política de forma nobre”, emendou.
- A Reforma política é a que mais precisamos neste momento. É tempo de conversar com a sociedade, de mudar o que tem de ser mudado e fazer política de cabeça erguida”, disse.
Mas assim como na Constituição de 1988, só valerá se for  aprovada aquela reforma que o PT apresentar. Senão, não terá jogo.

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