quarta-feira, 20 de agosto de 2014
Voto nulo aliado do PT
Hélio Duque
Nas eleições gerais de 2010, qualificaram-se 135 milhões de
homens e mulheres com direito ao voto. No segundo turno da eleição
presidencial, Dilma Rousseff foi a candidata vencedora com 54% dos votos
válidos. O oposicionista José Serra ficou com 44% dos votos válidos.
Chama a atenção o fato de 36% dos qualificados a votar optarem pela
abstenção ou voto nulo e branco. Número elevadíssimo. Resta indagar:
seria desencanto, protesto ou renúncia à cidadania por descrença nos
atores políticos.
Para as eleições de 2014, diferentes pesquisas vêm
mostrando que o fenômeno do voto nulo, branco e abstenção pode se
repetir. Chama a atenção ser majoritariamente uma opção dos segmentos
da população de maior renda e nível educacional médio e superior. Opera
como determinante aglutinadora, a chamada antipolítica. De acordo com
os seus pregadores seria uma intervenção cívica contra o poder,
objetivando limitar o raio de ação governamental pela pressão ética dos
cidadãos, enfrentando o mandonismo político partidário. A pregação da
antipolítica e antipartidos vem alargando as suas fronteiras no Brasil.
Infelizmente a quase totalidade dos partidos brasileiros não
abriga correntes de pensamento político. São instrumentos de barganha
patrimonial, negociando a adesão sem pudor aos governos de plantão em
nome da governabilidade. Ante essa realidade, a sociedade civil comete
equívoco mortal, do se considerar baluarte da virtude diante de um
Estado corrupto e clientelista. Ao enquadrar unilateralmente a corrupção
estatal, ignoram que a sua causa determinante são os corruptores, na sua
totalidade figuras proeminentes da chamada sociedade civil.
No Brasil dos dias atuais o voto nulo, branco o abstenção
representa um formidável aliado dos governos de plantão. Com a
agravante de ser uma plataforma política dos segmentos mais
esclarecidos e bem informados. Exatamente aqueles que aos olhos da
nação integram a opinião pública independente e crítica. Ao fazer a
escolha de anular o voto expressam forte convicção de discordar das
políticas públicas executadas pelos governos. Paradoxalmente pela atitude
assumida, tornam-se aliados de quem exerce a administração pública em
todos os níveis. No caso da República, a administração Dilma Rousseff
deveria incluir no seu programa de governo forte apoio aos defensores do
voto nulo, branco e abstenção. Em 2010 foi fundamenta para a sua
eleição.
Por fim, quando parte da opinião pública esclarecida passa a
acreditar que não precisa da política, relembremos Aristóteles. Na antiga
Grécia, ele conceituava o homem como animal político, onde a ética
pública não pode ser diferente da ética pessoal. A falta de espírito
republicano no Brasil vem sendo o principal foco alimentador do
desencanto de parcelas respeitáveis da opinião pública. Republicanizar a
política será um caminho longo a se perseguir, prestigiando homens
públicos íntegros e decentes, que são muitos, na imperativa missão de
aperfeiçoamento do nosso futuro democrático.
No seu livro clássico “Origens do Totalitarismo”, Hannah
Arendt, das maiores pensadoras do século XX, ensina: “A política, assim
aprendemos, é algo como uma necessidade imperiosa para a vida humana
e, na verdade, tanto para a vida do indivíduo, maior para a sociedade.
Tarefa e objetivo da política é a garantia da vida no sentido mais amplo”.
Vale dizer, mesmo deteriorada entre nós, a participação política é
fundamental na vida da população.
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade
Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de
vários livros sobre a economia brasileira.
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