segunda-feira, 2 de junho de 2014

O DNA do PT

Por Mary Zaidan

Dominar e controlar. Binômio caro aos totalitários, esse conceito frequenta a agenda petista com incrível assiduidade. Quer-se dominar todos os espaços, sejam eles institucionais ou não governamentais, o Parlamento, o Judiciário, as ruas. E controlar tudo o que for possível: dos meios de produção à mídia, dos preços ao cotidiano dos cidadãos, que em cada esquina esbarram na abusiva intervenção do Estado em suas vidas.
É no diapasão do domínio e do controle que se encaixa o decreto nº 8.243 da presidente Dilma Rousseff, criando quase uma dezena de instâncias para que gente indicada a dedo palpite na administração pública.
Com o pomposo nome de Política Nacional de Participação Social (PNPS), o decreto é multiuso: serve para tentar se conectar com grupos descontrolados e desconhecidos, que exigem mudança; para reabilitar movimentos populares que trocaram as bases por empregos públicos; para fazer de conta que se está ampliando os instrumentos democráticos. Antes de tudo, é mais uma cartada eleitoral.
Aliados e até juristas do PT dizem que a pretensão foi regular o artigo 1º da Constituição: “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. Estranho é ver gente tão preparada fazer pouco da mesma Constituição que logo adiante, no Art. 14, explicita as formas de participação popular: sufrágio universal, voto direto e secreto, com valor igual para todos, plebiscito, referendo e iniciativa popular.
Bastaria usar o cardápio existente. Mas é um caminho inseguro, de controle zero. Iniciativa popular gera coisas como a Lei da Ficha Limpa. Plebiscitos, comuns na maioria das democracias, passam longe da prática brasileira. Da promulgação da Carta de 1988 até hoje foram apenas três. Referendos? Só dois. Um sobre comércio de armas e outro para mudança do fuso horário do Acre.
Pode até não haver inconstitucionalidade no decreto de Dilma, até porque as centenas de comissões previstas não têm poder algum, nem consultivo nem deliberativo. Pouco valem na prática, mas escancaram o regime dos sonhos impresso no DNA do PT: a substituição da democracia representativa pela participação popular direta, bem envelopada, indicada e nomeada, devidamente controlada. Portanto, falsa.
Um modelo semelhante ao implantado por Hugo Chávez na Venezuela, com os seus Comitês de Terras Urbanas, conselhos comunais, coletivos populares. Ligados à Presidência, são aparelhos do poder disfarçados de democracia, que o ex Lula chegou a elogiar como “democracia em excesso”.
Mas nem Chávez foi tão longe quanto Dilma. Não tentou detonar a democracia representativa por decreto.
Mary Zaidan é jornalista. Trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília.

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