quinta-feira, 12 de junho de 2014

Seminário promovido pela Câmara debate intolerância religiosa




A intolerância religiosa foi o tema de um seminário promovido pela Câmara de Curitiba na tarde desta quarta-feira (11). A iniciativa foi da vereadora Carla Pimentel (PSC) e contou com a presença de várias lideranças religiosas, de representantes da sociedade civil organizada, órgãos públicos e dos parlamentares Noemia Rocha (PMDB), Chico do Uberaba (PMN), Jonny Stica (PT) e Bruno Pessuti (PSC).

“Liberdade religiosa é uma das garantias fundamentais previstas pela Constituição da República e atitudes que contrariem esta premissa devem ser combatidas”, afirmou  Carla Pimentel, que também entende ser função da Câmara de Curitiba dar ressonância ao tema. Ela acredita que este primeiro encontro para discutir a intolerância religiosa poderá servir para que novos aspectos sejam trazidos à pauta, e ajudem na construção de um entendimento em favor de uma “Cultura da Paz”.

“Queremos também uma ampla conversação entre as denominações religiosas, uma troca de experiências que contribua para a erradicação do preconceito contra as religiões”, destacou a parlamentar. Judeus, católicos, muçulmanos, evangélicos e umbandistas participaram do debate. No auditório, entidades como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o Conselho Regional de Psicologia, o Instituto Reage Brasil (defesa das empresas públicas) e o Grupo Dignidade (de promoção da cidadania LGBT) acompanharam o seminário.

Diferença de tratamento
A primeira palestrante foi a jornalista Mira Graçano, que trabalhou em veículos como a antiga TV Iguaçu, rádio CBN, CNT e na TV Paranaense, como apresentadora e editora do Paraná TV 1a Edição. Para Mira, o papel da mídia é intermediar de modo explicativo as questões que permeiam as relações sociais, mas o que se verifica é que ela acaba por difundir ainda mais os preconceitos. A grande mídia se deu conta de que o público religioso está em franco crescimento e possui alto grau de consumo. “Isso afeta as coberturas jornalísticas”, alertou ela.

Mira destacou dois vídeos que mostram como questões envolvendo líderes religiosos são abordadas pela imprensa. O primeiro mostrava uma matéria jornalística sobre a prisão do pastor Marcos Pereira da Silva, da igreja Assembleia de Deus dos Últimos Dias, do Rio de Janeiro, acusado de estupro, lavagem de dinheiro e ligações com o narcotráfico. Outra situação que ensejou uma abordagem, segundo ela, manipulada por parte da mídia, foi a do padre preso em Ibiporã conduzindo nu um veículo pelas ruas da cidade. Para a jornalista, o fato de se tratar de uma liderança religiosa acaba induzindo a um tipo de enfoque que seria diferente, caso não se tratasse de um religioso.

O advogado Acyr de Gerone, presidente da Comissão de Direito e Liberdade Religiosa da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Paraná (OAB-PR) trouxe alguns aspectos jurídicos à discussão. Ele destacou que a comissão recebe relatos de preconceitos contra seguidores de todas as religiões. “Trata-se de uma infeliz realidade em nosso Estado”, destacou ele.

Gerone relatou que a comissão da OAB-PR recebeu, por exemplo, a demanda de uma psicóloga evangélica, que alegou sofrer tolhimento no direito de exercer sua prática profissional pelo conselho de classe ao tratar de pacientes que a procuravam em busca de tratamento contra o sofrimento psíquico provocado, segundo eles, pelo fato de serem homossexuais. Foi montada uma subcomissão que entendeu que, de fato, a psicóloga sofreu preconceito por parte do Conselho Regional de Psicologia. “Necessário lembrar que a subcomissão era composta por não evangélicos”, asseverou o advogado.

A psicóloga Deusa Avellar, integrante do Instituto Reage Brasil, entende que a postura mais adequada é a de não se misturar crenças com a prática profissional. “Recebo muitos pacientes cuja primeira manifestação é querer saber minha orientação religiosa. Isso revela uma certa incompreensão da psicologia enquanto forma de ajuda, daí ser necessário que os profissionais da área ajam com responsabilidade social”, defendeu.

O rabino Pablo Berman falou em nome do Centro Israelita do Paraná. O rabino, que foi líder judaico em Buenos Aires, lembrou que naquela cidade o preconceito se traduziu algumas vezes em atos violentos. “Lá as paixões são levadas a extremos, mas isso não significa que aqui no Brasil o problema seja menor ou menos significativo”. Para ele, “o preconceito só se corrige com educação. É o único caminho”. Ele lembrou que Curitiba sedia o primeiro Museu do Holocausto da América do Sul.

Sylvio Fausto Gil Filho, professor de geografia da UFPR e vice-presidente da Associação Inter-Religiosa de Educação (Assintec), destacou que a instituição existe desde a década de 1970, mas foi a partir dos anos 1990 que ela ganhou uma condição multi-religosa. “Nosso objetivo é propagar o ensino religioso, mas vale destacar que nossa proposta não é doutrinária”, frisou ele.

Elói Correia dos Santos, técnico pedagógico de ensino religioso da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, também integrante da Assintec, destacou que o ensino religioso no Brasil de início se pautou pelo proselitismo, “até porque o tema foi trazido por padres catequistas”. 'Com a proclamação da República, em 1889, instaura-se o estado laico, ou seja, aquele em que não há vínculos entre fé e a administração pública”. Ainda segundo ele, “o atual ensino religioso no Paraná não pretende doutrinar, e sim difundir conhecimentos sobre todas as formas de entendimento do Sagrado, seja em liturgias, festas, ritos e outras manifestações”.

Para o padre Volnei Carlos Campos, representante da Mitra (Arquidiocese de Curitiba), a mídia tende a ver a igreja católica da mesma forma como via antes do Concílio Vaticano II, promovido pelo Papa João XXIII em 1962. “Foi um evento que mudou a mentalidade dos católicos”. Segundo o padre, a presença da igreja católica no Brasil ainda é significativa e a postura do novo Papa mostra que a instituição está disposta a tolerância e à pluralidade.

Gamal Fouad el Oumairi, diretor religioso da Sociedade Beneficente Muçulmana do Paraná, entende que as próprias denominações religiosas deveriam estimular o conhecimento da natureza e dos princípios das outras religiões. “Esta atitude seria bastante favorável para a diminuição do preconceito”, asseverou Gamal. O princípio da alteridade estabelece que devemos sempre considerar com respeito as opções do outro, pois desse respeito resultará a reciprocidade”.

Paulo Vieira, presidente da Federação Umbandista do Paraná acredita que a fé estimula a afinidade com o bem. “Não por acaso, muitas das escolas e hospitais construídos são frutos de iniciativas religiosas”, lembrou ele. Ainda segundo Paulo, “certamente acreditamos que uma postura ecumênica por parte de todas as tendências religiosas seria a atitude mais adequada e a mais em acordo com aquilo que nossas religiões apregoam”.

Tony Reis, do grupo Dignidade, falou em nome da causa LGBT, esclarecendo que nenhum gay pretende destruir a família brasileira. “Pelo menos essa é a ideia que vemos difundida em alguns veículos de comunicação, mas está longe de ser verdade. Queremos construir nossas vidas com respeito aos outros e, também, com respeito às nossas opções”, afirmou Tony.

Carta de intençõesA reunião resultou numa carta de intenções em prol da erradicação do preconceito religioso. “Repudiamos toda e qualquer atitude preconceituosa quanto às opções religiosas”, finalizou a vereadora Carla Pimentel. Também participaram do seminário o pastor Paulo Kenvert presidente da Igreja Assembleia de Deus em Almirante Tamandaré, o monge Eduardo Sassaki, representante da comunidade budista do Paraná e José Virgílio Góes, conselheiro da Federação Espírita do Paraná.

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