Do Globo:
A ideia da presidente Dilma Rousseff de dar a largada em seu segundo
mandato com um plebiscito para a mudança do sistema político já enfrenta
reação do Congresso, a começar por partidos da base aliada do governo,
entre eles o PMDB. Tanto na Câmara, como no Senado, os líderes
peemedebistas defendem a reforma política, mas insistem que a tarefa é
do Congresso Nacional e que o ideal é submeter as propostas a um
referendo popular, pela complexidade do tema.
Dilma propôs na campanha o fim do financiamento empresarial de
campanhas e das coligações partidárias nas eleições proporcionais, a
tipificação do caixa dois em crime eleitoral e a realização de um
plebiscito para a mudança do sistema político. Além destes temas, a
presidente enviou uma mensagem ao Congresso propondo cinco pontos a
serem submetidos à consulta popular: forma de financiamento das
campanhas eleitorais; definição do sistema eleitoral, se voto
proporcional ou distrital; manutenção ou não de coligações
proporcionais; continuidade ou não da suplência de senador; e fim ou não
do voto secreto no Congresso. Esse último ponto foi aprovado por
deputados e senadores, que acabaram com o voto secreto para cassação de
mandato. O plebiscito foi engavetado.
Na segunda-feira, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL)
divulgou nota defendendo a reforma política, mas não por meio de
plebiscito. “O melhor caminho é o Congresso Nacional aprovar a reforma —
caso contrário poderá pagar caro pela omissão — e submetê-la a um
referendo popular, como fizemos com a proibição de venda de armas e
munições”, defendeu Renan.
O líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), diz que aguarda para
ver quais perguntas Dilma fará, mas destaca que os novos parlamentares
eleitos têm tanta legitimidade como ela.
— A presidente quer substituir o Congresso e propor o plebiscito, mas
é bom lembrar que o Congresso foi eleito agora e é tão legítimo para
legislar quanto ela é para governar — afirmou Cunha, que também defende o
referendo popular e a aprovação de uma reforma política antes de
setembro do próximo ano: — A reforma política é urgente. Ninguém aguenta
mais a eleição do jeito que está, cara demais. Temos que conter a
proliferação de partidos.
O deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), que participou ativamente do
grupo de reforma política da Casa, diz que propor plebiscito sobre
reforma política é algo inviável.
— É impossível, é demagógico, é manifestação de ignorância no sentido
lato. Como submeter a proposta de voto distrital, distrital misto,
proporcional, etc, à população? A divisão que existe no Congresso estará
presente na sociedade. É um assunto complexo e longe do cotidiano das
pessoas. Cabe ao Congresso encontrar propostas e submetê-las em
referendo — disse Pestana.
Eleito senador por Goiás, Ronaldo Caiado (DEM) também critica a proposta de Dilma, classificando-a de “gesto de enganação”.
— O que me chamou a atenção foi que a reforma política proposta por
ela é um engodo, uma farsa. Não sinaliza com nada concreto e só
inviabiliza o processo verdadeiro para que consigamos aprovar a matéria
—argumentou Caiado.
Em entrevista ao Jornal Nacional, na segunda-feira à noite, a
presidente Dilma voltou a defender a convocação de um plebiscito para a
reforma política. Dilma citou a proposta feita pela Confederação
Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) e movimentos sociais. Segundo ela, os movimentos vão entregar ao
Congresso uma proposta para que se faça a consulta popular:
— Esse processo (consulta popular) é essencial para a reforma
política. Muitos setores têm como base (da reforma política) a proibição
de contribuições empresariais na campanha. A partir da reforma, só
seria possível, contribuições privadas individuais; não empresariais. A
oposição fala muito em fim da reeleição. Tudo isso tem que ser avaliado
pela população.
Durante a entrevista, a presidente foi lembrada que já havia
prometido uma consulta popular para reforma política em junho de 2013,
após os protestos que ocorreram nas principais cidades do país. Dilma
foi questionada o que a levaria a insistir na proposta, embora tenha
enfrentado críticas de juristas e congressistas. A presidente argumentou
que, no decorrer da campanha, ouviu esse pedido de um “conjunto de
segmentos” e que ele representa “um grande clamor da juventude”.
— O Congresso vai ter sensibilidade para perceber que isso (consulta
popular) é uma onda que avança. Se não estou enganada, (os movimentos
sociais) captaram mais de cinco milhões de assinaturas.
O presidente nacional do PT, Rui Falcão, disse ontem que o Congresso,
sem a pressão da sociedade, não conseguirá realizar a reforma política
como propõe a presidente e o próprio partido.
— A movimentação muito forte, que surgiu nas últimas semanas, assim
como aquelas manifestações de junho do ano passado, precisam estar na
ordem do dia. E nós, como partido que tem relações com os movimentos
sociais, só vamos obter a reforma política com essas mobilizações. Só
pelo Congresso Nacional, seja na configuração atual, seja na futura,
será praticamente impossível — disse Falcão, em entrevista coletiva para
analisar a quarta vitória consecutiva do partido para presidente da
República.
Ele disse que o PT defende a reforma política a após um plebiscito
para convocar uma constituinte exclusiva que trate das reformas.
— Já existe uma proposta da presidente Dilma no Congresso Nacional
com 189 assinaturas para que possa ser elaborado o decreto legislativo
que convoque o plebiscito. Uma das questões que estão sendo propostas
pelos movimentos sociais, e não pelo governo, é se você concorda ou não
com uma constituinte exclusiva para fazer a reforma política. Mas tudo
isso é passível de diálogo com o Congresso Nacional. Você pode fazer um
plebiscito que não preveja a convocação de constituinte. Você pode
submeter determinados temas a plebiscito. Tudo isso é objeto de debate. A
presidente disse ontem (anteontem) que quer dialogar muito com a
sociedade. Creio também que sobre a reforma política ela vai dialogar.