Em Aposta em Teerã, o ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia revela que não foi por falta de aviso que o episódio mais humilhante da diplomacia lulista ocorreu
Resenha de Diogo Schelp publicada em edição impressa de VEJA
A política externa no governo de Luiz Inácio
Lula da Silva ficou conhecida como “diplomacia megalonanica”. “Megalo”
por suas pretensões de alterar o equilíbrio de poder entre países ricos e
emergentes, de solucionar conflitos que se arrastam por décadas e de
reivindicar para o Brasil uma liderança não apenas regional, mas global.
“Nanica” porque, na prática, o soft power brasileiro, ou seja, o poder
de influenciar nações sem o uso da ameaça militar, é insuficiente para
atingir os objetivos grandiosos pretendidos pelo lulopetismo.
Em seu livro Aposta em Teerã (Objetiva;
152 páginas; 24,90 reais), que chega nesta semana às livrarias, Luiz
Felipe Lampreia evita usar expressão tão irônica – e, por isso mesmo,
tão eficiente em sintetizar a visão de mundo de Lula e de seus
conselheiros internacionais. Sua análise do maior fracasso da diplomacia da era Lula, a tentativa de solucionar o impasse em torno do programa nuclear iraniano, em 2010, dá mais voltas, mas chega à mesma conclusão.
Escreve Lampreia: “O governo do presidente Lula sempre foi caracterizado por um forte desejo de protagonismo diplomático. No caso do Oriente Médio, demonstrou um excesso de voluntarismo, que se revelou gratuito e inútil. No caso do Irã, fez uma leitura por demais otimista do nosso papel internacional”. Eis uma descrição diplomática do que é ser megalonanico.
Lampreia chefiou o Itamaraty entre 1995 e
2001, no governo de Fernando Henrique Cardoso, período que Celso Amorim,
o chanceler de Lula, depois afirmou ter sido marcado por uma diplomacia
tímida e de subordinação “aos ditames de outras potências”. Na verdade,
era apenas uma política externa que não se subordinava a interesses
partidários.
Com os contatos que ainda mantém no meio
diplomático, Lampreia reuniu informações de bastidores que demonstram
como o anseio pelo protagonismo impediu que Amorim e Lula percebessem
que as negociações com o Irã, em parceria com a Turquia, eram uma
armadilha.
Um pouco antes de desembarcar em Teerã, Lula
esteve na Rússia, ocasião em que o presidente Dimitri Medvedev alertou o
colega brasileiro em conversa reservada que “o jogo já estava jogado” e
que os membros permanentes do Conselho
de Segurança da ONU, mais a Alemanha, já haviam concordado em impor
novas sanções econômicas ao Irã. De nada adiantava, portanto, Lula
arriscar a sua projeção externa em um acordo pífio com o Irã.
Depois, durante as duras negociações em Teerã, em diversos momentos
os representantes iranianos perguntavam aos brasileiros e aos turcos se
os americanos aprovavam o que estava sendo discutido ali. Afinal, sem o
consentimento dos Estados Unidos, a suspensão das sanções, objetivo
maior dos iranianos, jamais poderia ocorrer.Amorim garantia-lhes, enfaticamente, que sim.
Ele estava se baseando em uma carta que o presidente Barack Obama escreveu para Lula, discorrendo sobre os planos do brasileiro de negociar com o Irã. Lampreia demonstra de maneira muito didática que Amorim fez uma interpretação equivocada da carta de Obama.
Em 17 de maio de 2010, divulgou-se a Declaração de Teerã, pela qual os aiatolás entregariam 1 200 quilos de urânio enriquecido para ser guardado na Turquia. No dia seguinte, Amorim recebeu uma ligação de Hillary Clinton, secretária de Estado americana, desautorizando o acordo.
Lula saiu humilhado do episódio. Foi a última grande aventura diplomática de seu governo. A sombra do fracasso em Teerã acompanha a diplomacia petista desde então.
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