Coluna do
Ricardo Setti - Veja Online
Reportagem de Hugo Marques publicada em edição impressa da VEJA
ENTRE A CELA E A SALA
Às vésperas da eventual decretação da
prisão dos mensaleiros, a Justiça manda suspender obras em presídio que estava
sendo reformado para dar mais conforto aos petistas condenados
É
inquestionável que no sistema prisional brasileiro impera, como regra, o
sistema de punição extremada adicional.
Um criminoso condenado à pena de privação da liberdade
vai ser submetido na penitenciária a uma série de outros castigos.
Ele pode ser estuprado.
Com certeza vai ser achacado por grupos de bandidos
que comandam o comércio de drogas e produtos ilegais na cadeia e que vão exigir
um pedágio para que os familiares consigam fazer chegar ao preso pacotes com
roupas, comida e cartas.
Com raras exceções, o presidiário vai ter de
sobreviver em celas superlotadas, em condições desumanas.
Ou seja, adicionalmente à pena de perda da liberdade,
ele sofrerá castigos extremos aos quais a Justiça não o condenou. Esse é o
destino que espera alguns dos mensaleiros condenados pelo Supremo Tribunal
Federal a penas de prisão fechada, caso se confirme a sentença, com a
aceitação ou não dos embargos infringentes.
É justo submetê-los ao inferno carcerário brasileiro
convencional ou, por se tratar de políticos, banqueiros e empresários, o grupo
não deveria cumprir pena no mesmo ambiente onde estão estupradores, assassinos
e assaltantes violentos? Essa é a discussão que, certamente, se seguirá ao ato
final da eventual condenação dos mensaleiros pelo STF.
Juízes encarregados de fiscalizar os direitos dos
presos dizem que não é aceitável colocar os mensaleiros em prisões comuns. Isso
equivaleria a expor a vida deles a riscos de morte e agressão violenta. Há
consenso entre especialistas em torno dessa questão de que é preciso evitar
esse tipo de situação.
Minimizar
esses choques, porém, é bem diferente do que se tentou fazer em Brasília, onde
o governo [petista] do
Distrito Federal mandou construir quatro celas especialmente para receber os
mensaleiros condenados. Seriam celas individuais com televisão, cama, chuveiro
elétrico e banheiro privativo — uma ala com grau de conforto inaudito em uma
penitenciária brasileira.
Era para tudo ser feito na surdina, mas
o plano foi descoberto. No ano passado, o governo do DF liberou 3,3 milhões de
reais para obras de reforma e ampliação do Centro de Progressão Penitenciária
(CPP), instituição do sistema penal para presos que cumprem penas no regime
semiaberto, que trabalham durante o dia e dormem na cadeia.
A obra, segundo o edital, tinha como objetivo ampliar
as instalações, criando 600 novas vagas. Como se vê no detalhe da foto no
começo deste texto, a ampliação começou — simultaneamente a uma discreta
reforma no prédio que fica situado na ponta do complexo.
Ali, no pequeno galpão, trabalhavam até dias atrás
pouquíssimos operários. Eles já haviam trocado parte do telhado, reduziam o
tamanho das janelas, construíam paredes no interior, revestiam o teto com forro
de madeira para diminuir o calor e retocavam a pintura pelo lado de fora.
No pequeno estacionamento à frente do prédio, uma
pilha de tijolos e um monte de areia denunciavam a obra. Trabalhadores do local
confirmaram que o galpão estava sendo transformado em quatro pequenas salas,
com banheiro e instalações completas para receber chuveiro elétrico, televisão
e até uma pequena geladeira.
Esses detalhes, porém, deveriam ser omitidos do grande
público. Há algumas semanas, o secretário de segurança do DF, Sandro Avelar,
foi procurado pelo secretário de Governo, Swedenberger Barbosa, que lhe transmitiu
um pedido que recebera do “Diretório Nacional do PT”. Os petistas, segundo ele,
queriam saber da possibilidade de promover reformas no CPP de modo a receber
alguns dos condenados no processo do mensalão, permitindo que eles cumprissem
suas penas com segurança e o mínimo de conforto.
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