KLEBER LEYSER DE AQUINO
Durante vários anos o povo brasileiro buscou o Estado Democrático de Direito e, depois de este se consolidar com muito sacrifício, vimos esse “direito” claramente expresso em nossa Constituição federal como um troféu pelo sucesso da luta do povo brasileiro nesse sentido. Pois bem, uma vez alcançada a tão almejada “democracia”, temos assistido, nos últimos tempos, a uma verdadeira inversão de valores, prevalecendo a manifestação de vontade de alguns sujeitos inservíveis à sociedade em prejuízo da grande massa trabalhadora e de bem.
Confundem esses poucos sujeitos, que se devem achar verdadeiros “heróis de histórias em quadrinhos”, intitulados black blocs, a democracia com a baderna. E no anonimato, armados com madeiras, placas, bombas caseiras, etc., agridem tudo e todos, ferem pessoas covardemente e depredam o patrimônio público e privado, como se estivessem vivendo numa terra de ninguém, sem lei e sem autoridades constituídas.
Dentre os direitos do povo brasileiro, a Constituição prevê o de “livre manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, conforme seu artigo 5.º, inciso IV. Estabelece ainda a Carta Magna, em seu artigo 5.º, XVI, que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização…”. Assim, o cidadão brasileiro, como tal, tem o direito de se manifestar publicamente, de forma pacífica, sem armas, expressando sua maneira de pensar, desde que não no anonimato.
O que nós vemos nas atuações dos black blocs, contudo, afronta todos os direitos constitucionais acima expressos, na medida em que atuam armados (com madeiras, ferros, placas, bombas caseiras, etc.), distribuindo violência tanto em face da pessoa como do patrimônio, público e privado. E o pior: fazem isso no anonimato, por causa das máscaras, das camisetas, dos panos, etc., que colocam no rosto, o que torna inviável a identificação deles – aliás, exatamente como fazem os presidiários diante de rebelião nos presídios.
A atuação violenta, armada e no anonimato desse grupo nas manifestações públicas, além de ferir diretamente a Constituição da República, no artigo e nos incisos acima citados, também afronta a Carta Magna quando impede o Estado de exercer o seu mister principal perante a sociedade, que é o de preservação da ordem pública – artigo 144, parágrafos 4.º, 5.º e 6.º, da nossa Lei Maior – por intermédio das Polícias Militar e Civil, na medida em que, assim agindo, impede a identificação dos autores dos crimes que são praticados, fazendo-os ficar impunes, o que serve de incentivo para que continuem agindo da mesma forma, desmoralizando as autoridades constituídas e afetando a ordem pública.
Além disso, também sobressai, com clareza, que colocar máscaras, panos, camisetas, etc., no rosto para esconder a identificação, em manifestações populares, é ato preparatório para a prática de crimes. E, embora não seja ainda um fato típico (previsto como crime), pode e deve ser impedido pela polícia, como obrigação legal que tem de impedir a prática de crimes, sob pena de sua omissão ser caracterizada como “penalmente relevante”, nos termos do artigo 13, parágrafo 2.º, alínea a, do Código Penal. Ou seja, a omissão, que normalmente é um irrelevante penal, passa a ser algo de relevância penal nas hipóteses em que o omitente tem o dever de agir para evitar o crime e não o faz.
Considerando que o ato de participar de baderna pública com cobertura no rosto, impedindo a identificação, como dito, é fato antijurídico, ofensivo à nossa Constituição, além de ser também ato preparatório para a prática de crimes, as Polícias Militar e Civil devem agir para impedir tal conduta. A Polícia Militar, que atua de forma ostensiva, já no momento em que esses indivíduos colocam suas “máscaras”, demonstrando claramente a intenção de agir no anonimato, deve agir e abordá-los para apreensão de tais instrumentos (máscaras, panos, camisetas, etc.), da mesma forma que essa mesma polícia apreende rojões, pedaços de madeira, de ferro, etc., de torcedores que entram nos estádios de futebol.
Enquanto o sujeito estiver apenas com a máscara no rosto, a providência da polícia de apreender o instrumento é o bastante e está dentro da estrita legalidade. Todavia tal providência pode ensejar desdobramentos, como o não atendimento à ordem legal do policial de apreensão, o que acarretará a prática do crime de desobediência, que poderá ainda ser seguido dos crimes de desacato caso o policial seja ofendido no exercício da função. E, se for o caso, de resistência, caso seja necessário o uso de força física pelo policial para a apreensão referida.
Nessas três hipóteses, em conjunto ou individualmente, já se justificaria a condução do agente à delegacia de polícia para as respectivas responsabilizações criminais.
À Polícia Civil caberia, no exemplo acima, a elaboração do Termo Circunstanciado, desde que o agente pratique um só dos crimes acima citados (desobediência: artigo 330 do Código Penal; desacato: artigo 331 do mesmo código; resistência: artigo 329, idem). Se praticar mais de um deles, o somatório das penas supera os dois anos de pena máxima em abstrato e foge à competência da lei do Juizado Especial Criminal (JECrim) – Lei n.º 9.099/95) -, cabendo o flagrante normalmente, independentemente da hipótese excepcional admitida no artigo 69, parágrafo único, primeira parte, da referida lei do JECrim. Isso, obviamente, somente como possíveis desdobramentos do fato de o sujeito estar participando de reunião pública escondendo o seu rosto e impossibilitando a sua identificação.
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