Fixado em agradar os rentistas com superávits primários cada vez mais “robustos”, o governo não se cansa de buscar cortes no Orçamento. Agora é a vez da Previdência Social. Usando o surrado pretexto de que há um rombo em suas contas, dirigentes do Ministério da Previdência Social apontaram o dedo para o trabalhador. “O vilão do rombo é o auxílio doença e invalidez”, acusam. A concessão de auxílios-doença e invalidez, segundo esses indivíduos, atingiu a cifra “alarmante” de R$ 65,4 bilhões em 2013.
Para reduzir esses “gastos exorbitantes”, o governo está programando cortes que podem chegar a 40% desse valor por ano até 2024. Isso resultaria, em seus cálculos, numa economia de R$ 20 bilhões no último ano, em valores nominais. Em uma década, haveria uma economia de R$ 108 bilhões que poderia, segundo os burocratas, engordar o superávit primário. As informações sobre esses valores foram adiantadas pelo secretário de Políticas de Previdência, Leonardo Rolim.
Segundo ele, do total de benefícios concedidos todo ano, 18% são para atender os casos de invalidez. O governo quer baixar esses benefícios ao nível de 10% do total, que seria “um nível aceitável”. Não por acaso esse nível considerado “aceitável” pelo Planalto é semelhante ao índice draconiano que a União Européia e o FMI estão tentando impor à Grécia, e que vem causando uma crise social e política sem precedentes naquele país. A intenção é que a partir da recomendação de uma perícia médica do INSS, o beneficiário seja submetido a uma reabilitação física e profissional conjunta. A pessoa considerada inválida passará a ser reavaliada a cada dois anos.
Essas resoluções contra os trabalhadores, contra os inválidos e contra os aposentados baseiam-se numa premissa de que a Previdência teve um rombo de R$ 49,9 bilhões em 2013. A informação sobre esses números ainda não foi feita oficialmente pelo governo, mas eles já estão servindo de base para a programação dos cortes. Só que na verdade não houve rombo nenhum. A Previdência é superavitária. O que eles chamam de “déficit” é a parte que é de responsabilidade do Tesouro para cobrir suas políticas sociais.
E quem já explicou isso com bastante ênfase foi o próprio ex-presidente Lula. Ele disse que estavam erradas as informações que davam conta de um rombo nas contas da Previdência Social em 2006. Explicou à época que o suposto “rombo” de R$ 42 bilhões, naquele ano, “não podia ser considerado como déficit da Previdência”. Este valor, segundo o presidente, “corresponde, não a um déficit da Previdência Social, mas às despesas com a política social do governo”. Dentro dessas despesas estão as aposentadorias rurais que foram assumidas pela União – por decisão política do país -, as despesas com assistência social – que é do Tesouro – e as isenções fiscais incidentes sobre folha de pagamento que atingem os cofres da Previdência (ver matéria nesta edição, na página 2). Isenções ou desonerações que castigam a Previdência para favorecer grandes empresas e multinacionais. Em 2013, a carga da desoneração da contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento desviou da Previdência R$ 9 bilhões.
A volta do discurso de que a Previdência Social está no vermelho e que é preciso cortar direitos da população usuária, é mais uma prova de que o governo Dilma está cada vez mais aferrado ao tripé neoliberal. A presidente garantiu semana passada que vai buscar o centro da meta de inflação em 2014, leia-se mais cortes de despesas e arrocho salarial. Luciano Coutinho, do BNDES, rendeu nesta quarta-feira (22) homenagens ao atual câmbio que “flutua” sempre a favor das importações e o ministro Guido Mantega, por sua vez, disse que por um “primário robusto” vai cortar no seguro-desemprego e no abono salarial. A Previdência, é claro, não podia ficar de fora.
O arrocho será tal que mesmo sendo submetido a uma cirurgia, por exemplo, o beneficiário passará a ser acompanhado de perto para voltar logo ao trabalho. Se ficar inválido e não puder voltar à função original, a empresa terá que indicar outro posto para o funcionário. O governo exigirá requalificação de uma pessoa considerada inválida, via programas como Pronatec, e até tentará recolocar o profissional no mercado, a partir da base de dados do Sistema Nacional de Emprego (Sine). Um grupo interministerial deverá aprovar as regras até março. Na avaliação do governo, em casos mais graves, seria possível reduzir os custos aos cofres. Seria pago um auxílio-acidente, benefício de curta duração e valor bem menor que aposentadorias por invalidez e auxílios-doença.
Como o atual governo está cada vez mais distante da visão e da política de Lula e mais perto da política neoliberal de FHC, voltam com força as vozes que defendem a elevação da idade mínima de aposentadoria e o aumento do tempo de contribuição. “O ideal seria fixar uma contribuição na faixa de 40 anos”, avalia o secretário de Políticas de Previdência, Leonardo Rolim. Ou seja, por um “superávit primário robusto”, vai ser mais fácil morrer do que um trabalhador se aposentar no Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário